Anatomia do Inconsciente, Entre Deslocamentos e Sobreposições

Anatomy of the Unconsciousness, Between Dislocation and Overlapping

Artista visual, Arte-educador, Quadrinista e Ilustrador brasileiro. A arte de Pedro Panta versa sobre o corpo e suas diferentes formas de representação, sobre o grotesco e, em especial, o terror psicológico.
Em 2022 recebeu a medalha MMDC da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo pelo reconhecimento de sua atuação na educação brasileira.

Em 2015 integrou o livro “O Rei Amarelo” com importantes artistas quadrinistas, com a história + ilustração intitulada Fantasmas na máquina, e realizou produções independentes como Ida e Volta (2012) que conta a história de um jovem que se perde no tempo e espaço nos túneis e vagões do metrô à procura da pessoa amada, e Moinho (2015), história de um jornalista fracassado que tenta encontrar uma matéria que alavanque sua carreira profissional.

Artista:
Pedro Panta

Curador:
Sandro Leite

As extraordinárias criaturas e os estudos anatômicos horripilantes de Pedro Panta esticam o nosso olhar para além da epiderme, alçando veias, músculos, vísceras.
Uma viagem interna.
O exercício criativo a que se propõe foi tema de tantos outros artistas como: Leonardo da Vinci e suas dissecações, do pintor Francis Bacon, dos artistas Adriana Varejão e Danny Quirk, do desenhista e escultor Hans Bellmer e até mesmo do consensual Rembrandt e sua aula de anatomia. Ver por dentro é um desejo de criança que toma uma dimensão científica com a invenção de microcâmeras que capturam imagens internas, assim como as ressonâncias magnéticas. Ver por dentro vai muito além de uma curiosidade e se estende ao desbravamento do universo com as sondas espaciais, assim como a exploração do fundo do mar com suas criaturas insólitas e as tantas histórias fabulosas inventadas por Júlio Verne. Desbravar o desconhecido talvez revele uma intuição de que a dimensão humana extravasa os limites (do próprio corpo) para além das fronteiras estelares ou aquáticas. Como se a insistência na conquista do espaço sustentada pela disputa entre as poderosas nações fosse apenas um pretexto que encobre um sentimento mais profundo: estendendo meu corpo até os limites do mundo, me expandindo, é que eu me enxergo por inteiro.

Mas para conhecer o mundo basta olhar para dentro. Somos o protótipo do funcionamento cósmico.
A imagem e semelhança de Deus.
O micro do macro.

A divindade moldada a partir do corpo e forma humanas.

As obras de Pedro Panta convidam a olhar para dentro. Uma anatomia da alma. Uma anatomia do inconsciente.

O olhar para dentro revela aquilo que foi projetado para não ser visto, como espiar o processo de gestação – uma afronta à hegemonia do olhar que tudo vê, mensura e controla (um dos pavores que os homens nutriram durante milênios foi a capacidade de as mulheres gerarem “coisas” sem que eles pudessem controlar ou ver).

Quando o sangue escorre de dentro para fora ou um acidente provoca uma fenda na pele, de onde é possível se ver o interior, um sentimento de aflição, de pavor pode tomar conta de nós. Talvez a maior perturbação seja a tentação de abrir mão das personas (epidérmicas) criadas e moldadas ao longo de séculos de humanização para se render àquilo que nos reduz a uma espécie única, com igualdade de órgãos, cor de sangue e ossos.

Olhar para dentro é um processo de conhecimento, de autoconhecimento. E hoje... o quanto estamos distantes de nós mesmos?!

Um dos estudos de Pedro Panta é o que se conhece como teratoma – um tumor constituído de tecidos, como cabelo, músculo e osso. Ou seja, uma formação anômala que revela um desejo da natureza de transgredir. Na arte, o horrendo, o insólito, a distorção e o sublime cumprem essa função.

Beleza é invenção, não é norma!
O estranho e o estrangeiro que nos compõe.
Talvez seja estranho porque é distante, desconhecido, sombrio, inconsciente ou fica escondido. O estranho está dentro, habita dentro de nós, nos movimenta e por vezes nos controla/domina. Assim é na psicose, assim também no processo criativo que culmina no êxtase e no orgasmo. Ser criativo é se dispersar, perder a cabeça, se entregar aos sentidos. É orgia!

Retomando nossa conversa... Por que insistimos em ver por dentro? Para ver desnudando! Para romper a ditadura de uma beleza forjada, ajustada! Para revelar outras mais pulsantes e estarrecedoras! Para ativar sentimentos mais profundos! Para rasgar o véu da prudência e do bom senso! Para sermos mais cruéis, porque da barbaridade do mundo pela norma, já não suportamos mais.

Voltemos para dentro!
Para nos recompor.
Para nos nutrir.
Somos nós, mestres e servos de nossas desgraças e redenção.